quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Literatura em quadrados (Retalhos)

“Nossas cartas eram um flerte, desde tímidos bilhetes até pacotes perfumados e abarrotados de flores e poemas, canções de amor e fitas cassete e besteiras adolescentes”

Ao escrever, desenhar e também protagonizar Retalhos, Craig Thompson dá veracidade à poesia de seu trabalho. Mesmo sendo autobiográfica (e não há mesmo muito lirismo na vida cotidiana), nos entorpece com uma beleza raras vezes vista em HQ’s. Ganhadora de alguns dos prêmios mais importantes da área, essa é mais do que a história de um garoto que não se encaixa nos padrões e nas exigências da sociedade. Fala de amor, incertezas e crescimento.

Craig é somente um garoto que divide a cama com o irmão. Vivem uma infância em que sonhar é o que lhes resta. Os pais, religiosos fervorosos, não sabem que isso muito mais atrapalha do que ajuda na criação dos dois e o pastor da igreja vive a defender a total entrega ao mundo da religião. E tem os valentões, porque esses estão em todos os lugares. E para um cara como ele a única solução é mesmo fugir, evitar, se esconder.

Mas também há Raina!

Raina é um raio de sol na vida do nosso herói. A menina bonita, o primeiro amor, as primeiras descobertas para além do quarto e da cama que só servia para as brincadeiras com o irmão na infância. A colcha de retalhos que ela lhe dá de presente e a parede do quarto dela, em branco para que Craig pinte algo. E ele desenha a beleza do que sente por ela, na parede e na alma.

A Graphic Novel é tão repleta, em todos os sentidos, que fica difícil estabelecer sobre o que realmente fala a obra. A princípio, a julgar pela descrição acima, mostra como o primeiro amor liberta uma criança reprimida, transformando-a em um adolescente normal. Mas pode ser somente uma história de amor, fraternal, carnal, o que seja. E podemos também vê-la sob o ponto de vista da religião (alienação) ou absorver a mensagem de que o “american way of life” sempre esmagou e continuará a esmagar aqueles que não se adaptam, os fracos, os chamados "losers". Esses mesmos que anos depois entram em shoppings com semi-automáticas carregadas de munição e ódio, e ninguém entende qual é a motivação de um cara desses. Retalhos dá uma dica.

Thompson felizmente não seguiu esse caminho. Presenteia a todos com uma verdadeira obra-prima dos quadrinhos. Transbordando poesia em traços e letras, Retalhos é um trabalho consistente o suficiente para ser colocada lado a lado com alta literatura, com a diferença de que eu nunca vou conseguir ler um livro de 600 páginas em quatro horas, como fiz com essa genial e (merecidamente) premiadíssima Graphic Novel.

Os prêmios: Três Harvey (melhor artista, melhor Graphic Novel e melhor cartunista), Dois Eisner (melhor Graphic Novel e melhor escritor/artista) e um prêmio da Associação Francesa de Críticos e Jornalistas de Quadrinhos.

Para quem se interessou e para os que já leram e gostaram, Craig Thompson estará no Brasil em outubro, na 6ª edição do FIQ (Festival Internacional de Quadrinhos) em Belo Horizonte. Mais detalhes no blog do evento.

Acessem também a página do próprio Craig Thompson.

3 comentários:

  1. Vem cá, para quem não leu nada desses quadrinhos mais modernos, que têm sido lançados em livros, e não em gibis, acho que esse pode ser um bom começo, não?!
    Quanto $ lá na Realejo?

    Amo.

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  2. Dom Mimi de las Maresias Buenas19 de agosto de 2009 às 18:19

    Espero que venha mais biografias em quadrinhos

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  3. Retalhos tão pequenos de nós dois, são coisas tão pequenas prá esquecer, e toda hora vão estar presentes, você vai ver...

    E se outro cabeludo aparecer na tua vida, e isso te trouxer saudades minhas, a culpa é tua...

    O resto é silêncio!

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